quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Eleições e o efeito Panúrgio



Samuel Câmara
Pastor da Assembleia de Deus em Belém

 Estamos construindo esta grande Obra, marco da Geração do 1º Centenário, na História da “Igreja Mãe” das Assembleias de Deus no Brasil e no mundo. Sob a Direção do seu Presidente, Reverendo Samuel Câmara,Belém Pará-Brasil.
(Costa)

Panúrgio é um personagem falante e simpático, mas sem dinheiro, criado por Rabelais em seu romance Pantagruel. Panúrgio fora injuriado por Dindenaut, vendedor de carneiros. Para vingar-se, ele arranjou dinheiro e comprou do homem que lhe injuriara os carneiros mais bonitos e os jogou ao mar. Os demais, vendo isto, seguiram cegamente os primeiros e todo o rebanho pereceu nas águas. Dindenaut e seus ajudantes jogaram-se também ao mar na tentativa de salvar os carneiros, mas também se afogaram.

Com o tempo, o personagem emprestou seu nome à gramática, e Panúrgio virou sinônimo de “espertalhão, astuto”. Um sujeito panúrgico passou a ser identificado como aquele que imita outro, que procede por espírito de imitação, tal qual fizeram os carneiros de Panúrgio. Esta se tornou uma expressão adagiária para indicar a mentalidade gregária do povo: basta que alguém eleve a voz para que a maioria o siga sem raciocinar.
        
           O efeito Panúrgio é a ação de uma maioria destrambelhada que acompanha cegamente quem mais grita, sem examinar minimamente as razões de seu discurso. Principalmente em época de eleições, isto é algo que a sociedade deve evitar.
        
          Não são poucos os candidatos que tentam passar a impressão de que são mais virtuosos que todos os outros. Fazem-nos pensar que, uma vez eleitos, a vida será transformada num mar de felicidade. O panurgista tenta nos fazer crer que é o candidato perfeito e espera que os “carneirinhos” (eleitores) sigam os seus passos.

A palavra candidato deriva de cândido (alvo, imaculado). Historicamente, remete-se ao Senado Romano, onde cada senador devia ter uma idade avançada (significando conhecimento e experiência) e vestir uma túnica branca (representativa de pureza).

A julgar pelos efeitos da Lei da Ficha Limpa, cuja aplicação tem tentado barrar milhares de “candidatos” em todo o Brasil, esse conceito tornou-se caduco. Esta é, portanto, a primeira razão pela qual candidato perfeito não existe.

A segunda razão vem do significado da palavra perfeito (do Latim, perfectu), que é “feito até o fim, acabado, terminado”. Um “candidato perfeito”, etimologicamente falando, deveria ser alguém completo, sem nenhuma falha.

Mesmo sem candidatos perfeitos, temos que ter em mente que nenhum povo consegue ser sério, próspero e respeitado se os políticos e governantes não forem bem escolhidos nas eleições. Eleição é o mesmo que escolha. Uma escolha pressupõe preferência, predileção, mas sob a égide do discernimento. Assim, temos de escolher os melhores; ou, na pior das hipóteses, os “menos ruins”.

Cair no extremo oposto de deplorar constantemente a classe política, sem fazer absolutamente nada para mudar a situação, é uma atitude negligente e cômoda de quem vive criticando, mas nada faz. As pessoas responsáveis, porém, têm de fazer algo a partir do seu próprio voto. É esse o tecido de que é formada a democracia.

O que temos de entender adequadamente é que, a despeito da imperfeição dos candidatos, a operação da graça de Deus, mediante as nossas orações e vigilância, pode ajudar a brotar o melhor da sua humanidade. O candidato que for eleito, embora imperfeito, poderá agir decente e racionalmente para o bem comum e contribuir para resolver os intrincados problemas sociais que acometem a nossa sociedade.

Temos de reconhecer, igualmente, o potencial humano para o comportamento interesseiro e pecaminoso. É isso que torna a democracia essencial, como disse o filósofo Rienhold Niebuhr: “A capacidade do homem para a justiça torna a democracia possível; mas a inclinação do homem para a injustiça torna a democracia necessária”. É isso que torna o seu voto importante e imprescindível.

O efeito Panúrgio identifica o nível de irresponsabilidade social em que se encontra a consciência de certos eleitores que votam pelos motivos errados. Aquele cuja consciência se encontra no estômago, pois vende o seu voto por um mero repasto, uma cesta básica, por exemplo. Outro cuja consciência está no bolso, pois vende o seu direito de cidadania por uns míseros trocados. E alguém que se deixa levar pelas emoções da hora e vota porque o candidato tem charme ou fala bonito, ou porque é sectário do voto útil.

Esta é a hora e a vez da sua consciência esclarecida, cujo voto pode ajudar não somente a banir das eleições o efeito Panúrgio, mas também mostrar que a vida, principalmente nesse caso, não precisa imitar a arte. E que Deus nos ajude!
       







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