sábado, 27 de novembro de 2010

Manifesto de carga moral

 





Samuel Câmara
Pastor da Assembleia de Deus em Belém




Quando o transatlântico Titanic fragorosamente afundou, em 1912, houve rumores de que havia em sua carga uma fortuna em dinheiro, joias e ouro. Era um mito. Quando o manifesto de carga do navio foi descoberto, estava ali registrado que a carga consistia apenas de matérias-primas: linho, palha, peles de animais, peças de carros, couro, elásticos, perucas e equipamentos de refrigeração.

        A vida também é semelhante. Algumas pessoas são reverenciadas e honradas pela riqueza e poder que possuem, até que o “manifesto de carga” de seu patrimônio moral seja finalmente revelado.

        Há tão fartos exemplos na vida, tão exaustivamente esmiuçados, que se torna desnecessário voltar a mencioná-los. Mas, infelizmente, há de se fazer notar que, como resultado de uma equivocada inversão de valores, não poucas pessoas acham que alguém deva ser honrado e reverenciado simplesmente por ser rico e poderoso, mesmo que seja ímpio e reprovável. 

Por outro lado, se uma pessoa vive uma vida honrada e bem disciplinada, é considerada por muitos como menos digna de consideração, se for pobre. Mas com o tempo, quando o “manifesto de carga” moral de cada um é encontrado, revela finalmente qual vida contém algo de valor duradouro, ou nada que valha a pena.
        
Como podemos avaliar o significado de nossas vidas e o tesouro que elas contém? Todos sabemos que bem no fundo do nosso ser algo nos diz que tal coisa não pode ser medida em termos de riqueza, fama ou poder.

Jesus ensina que uma pessoa é conhecida pelas suas atitudes na vida: “Pelos seus frutos os conhecereis. Assim, toda árvore boa produz bons frutos, porém a árvore má produz frutos maus” (Mt 7.16,17).
       
           Conta-se a história de uma dedicada serva de Deus que, embora frágil, tinha forças para cuidar dedicada e amorosamente de doentes terminais de várias moléstias. Um rico proprietário de uma companhia de petróleo, que a visitava e queria destinar uma generosa doação àquele fim, lhe disse: “Irmã, eu não faria isso por dinheiro nenhum no mundo”. Ao que a franzina mulher respondeu: “Nem eu”.

O “manifesto de carga” da sua vida demonstrou que o seu tesouro era servir aos outros e isso não tinha preço.
        
           Há pessoas que tentam a todo custo alardear suas virtudes e acabam por se tornar alvos fáceis do patrulhamento de gratuitos plantonistas da virtude, que procuram mostrar somente seus defeitos, o pior “manifesto de carga” possível, como se nada mais houvesse de bom ou valoroso naquela vida.
        
          Os discípulos de Jesus gastavam muito tempo tentando descobrir qual deles seria o maior. Jesus falou-lhes repetidas vezes que o maior dentre eles seria quem mais servisse, não o contrário. E acrescentou dizendo que Satanás havia reclamado o direito de “peneirá-los como trigo”, mas que Ele mesmo havia orado, especialmente por Pedro, para que a sua fé não desfalecesse quando o “manifesto de carga” moral da sua vida fosse finalmente demonstrado (Lc 22.31).
        
           Essa peneiração tinha o sentido de deixar cair o trigo (o bom de suas vidas) e soltar ao vento toda a palha (o que não prestava). Os discípulos aprenderam essa dura lição e, tempos depois, puderam demonstrar ao mundo o tesouro de valores morais e espirituais que Jesus construíra em suas vidas.
       
          Há situações em que ninguém encontrará nada de errado numa vida, mas mesmo assim dará um jeito de criar situações embaraçosas. Foi assim com Jesus. Por inveja enviaram soldados para prendê-lo, mas estes voltaram dizendo: “Jamais alguém falou como este homem” (Jo 7.46). O “manifesto de carga” moral da Sua vida dizia que Ele era digno e santo: “Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos, o qual não cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca” (1 Pe 2.22).
       
           Foi assim também com Daniel, que tinha uma alta posição na corte de Babilônia. Quando o reino babilônico caiu, conquistado pelo medo-persa Dario, este queria colocá-lo como primeiro-ministro. “Então, os presidentes e os sátrapas procuravam ocasião para acusar a Daniel a respeito do reino; mas não puderam achá-la, nem culpa alguma; porque ele era fiel, e não se achava nele nenhum erro nem culpa” (Dn 6.4).

Então eles forjaram uma lei que ordenava que por trinta dias ninguém poderia pedir coisa alguma a nenhuma outra pessoa ou deus, só ao rei. Então, a “CPI Babilônica” achou a única acusação contra Daniel: ele orava a Deus três vezes ao dia.

O julgamento da História é implacável. O “manifesto de carga” moral de uma vida será a palavra final do tipo de tesouro que representou toda a sua existência.







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