Até onde vai a vida e começa a sobrevida?
Passei algum tempo tentando encontrar o melhor tema para inaugurar minha coluna nesse espaço. Queria algo que trouxesse a idéia de início, de ponto de partida. Algo que possuísse uma idéia apaziguadora e ao mesmo tempo, incomodasse. Bom, definido esse perfil, não precisei de muito tempo para chegar ao tema central: a morte.
Mas o que é morte? Uma nuvem negra que paira sobre a vida humana? Um ponto aparentemente desconhecido, na periferia de uma gaussiana? Um animal feroz e incansável correndo atrás de sua presa e essa sabendo que se tropeçar, cansar-se ou não for rápida e esperta o suficiente, fatalmente será alcançada?
Willian Randolph Hearst, proibiu que se usasse essa palavra morte na sua presença. Filipe II, rei da Macedônia e pai de Alexandre, o Grande, ao contrário, chegou a designar um empregado para que diariamente lhe dissesse: “Lembre-se Felipe, de que você vai morrer”.
Foi Quintana quem disse: "Morrer, que me importa? (...) O diabo é deixar de viver". Pois em sua visão, deixar de viver era certamente um problema maior que a própria morte. Pensamento compartilhado por Niels Bohr (o mesmo do modelo atômico), quando declarou que “o sentido da vida está em que não há sentido uma vida sem sentido”.
Se Quintana está certo, muito dos recursos heróicos para evitar que um paciente morra, seriam na verdade uma violência ao principio do “deixar de viver”, pois há dores que fazem algum sentido, como as do parto: uma vida nova nasce. Mas há dores que não se justificam, como prolongar a agonia de um paciente para manter a consciência tranqüila do médico ou da família, por terem feito o que o costume obriga, e que se dá a esse costume o nome de ética, sem se questionar se de fato houve “ética”, uma vez que "reverência pela vida" é o supremo princípio ético do amor.
É interessante notar que na saúde como um todo, você tem disponível um profissional para cada peculiaridade, mas não existe um “morteoterapeuta”, um profissional especialista para cuidar dos que estão morrendo. Cuidar da vida que se prepara para partir, para que seja de forma suave, sem dores e digna, longe de tubos, agulhas e ambientes que nos provocam arrepios.
Você nesse momento estará dizendo bem baixinho, que é dever dos médicos fazer o possível para que a vida continue. Eu concordo, mas saliento que não é dever exclusivo dos médicos, é nosso. Eu, a meu modo, luto também pela vida. A literatura mantém vivo Machado de Assis, Camões, Pessoa, Renato Russo, Agostinho e tantos outros. A questão é até onde vai a vida e começa a sobrevida?
Bem, o tema era morte, mas não me vi capaz de defini-la perfeitamente, talvez definindo vida, possa formar um conceito mais exato de morte. Mas afinal, o que é vida? Mais precisamente o que é vida de um ser humano? Talvez um ziguezigue num monitor cardíaco? Acredito que seja algo mais do que um coração batendo e ondas cerebrais. Não acredito ser a definição biológica a mais completa, quiçá a mais correta.
Um dia me disseram que morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o preto no branco e os pingos nos “is” a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam brilho nos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços... Sentimentos.
Vejo que também é complicada a tarefa de definir vida, será que é possível defini-la estando vivo? O que se dirá então, sobre a tentativa de definir morte estando vivo?
Mas e aí, será que podemos concluir que independente do conhecimento da morte e da dificuldade de se conceituar vida, de fato a vida vale a pena? Acredito que essa pergunta não caberia a um homem, mas sim a um embrião.
Por Antunes Weide
Colunista Brasil Escola
www.brasilescola.com/religiao/consideracoes-sobre-vida-morte.htm
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