quarta-feira, 9 de julho de 2008

Para especialista, Israel pode atacar Irã nos próximos seis meses
















FERNANDO SERPONE
da Folha Online





Apesar da instabilidade no Oriente Médio e do preço do petróleo em alta, um ataque contra as instalações nucleares do Irã por parte de Israel se torna cada vez mais provável. Essa é a opinião de Ilan Berman, vice-presidente do American Foreign Policy Council, think-tank baseado em Washington. "Não é uma questão de pesar os benefícios de agir nesse momento, que é realmente ruim", disse Berman em entrevista à Folha Online. "A questão é se (o Irã com tecnologia nuclear) é grave o suficiente para demandar ação."





Arte Folha Online/Arte Folha Online

Para o especialista, autor do livro "Tehran Rising: Iran's Challenge to the United States" ("A Ascensão de Teerã: O desafio do Irã para os EUA"), é improvável que os EUA ataquem o país persa. O fato de ser ano eleitoral, a baixa popularidade do presidente George W. Bush e um relatório das agências de inteligência do país, afirmando que Teerã desistiu de produzir armas nucleares, estão entre os motivos apresentados por ele.





No entanto, segundo o especialista, para Israel, o Irã representa uma "ameaça existencial". O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad atacou Israel publicamente em várias ocasiões, dizendo que o país deveria ser "riscado do mapa" e que o Holocausto nazista seria "uma invenção sionista".





O analista explica que Israel, após esperar por muito tempo que os EUA tomassem a frente, começou a pensar "como seria se eles tomassem a iniciativa". O especialista cita o exercício militar realizado por Israel há algumas semanas, considerado uma simulação de ataque aéreo contra o Irã.





Berman diz acreditar que o período "favorável" para um ataque está acabando. "Eles (israelenses) não acham que, se houver uma administração de [Barack] Obama e, possivelmente, se houver uma administração de[John] McCain-- terão tanta liberdade de movimento quanto têm agora", explica Berman. "Israel poderá (ter) sob McCain, mas certamente não sob Obama. Se você é um estrategista israelense, está vendo os próximos seis meses como o momento para se fazer algo."





Para os EUA, a preocupação com a existência de um Irã nuclear tem dois motivos, de acordo com o americano --primeiro, porque Teerã é "o principal patrocinador do terrorismo no mundo". Segundo, porque, desde que o programa nuclear iraniano veio à tona, outros 12 países da região tomaram iniciativas no sentido de adquirir tecnologia nuclear.





"A forma com que [os EUA] lidarem com o Irã irá definir as decisões estratégicas que esses países irão tomar", afirma Berman. "Se eles [países do Oriente Médio] acharem que os EUA não são capazes ou não querem lidar com o Irã, irão buscar essa capacidade (nuclear) para contrabalancearem a capacidade nuclear iraniana."





Leia a seguir a íntegra da entrevista, concedida por telefone, de Washington:





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Folha Online - Considerando a situação econômica atual --o preço do petróleo-- e a instabilidade no Oriente Médio, o sr. crê na possibilidade de um ataque às instalações nucleares do Irã?





Ilan Berman - As questões são separadas. Com certeza há um cenário muito instável no Oriente Médio e os altos preços do petróleo. Mas a questão da aquisição de capacidade nuclear do Irã independe disso.





O Irã, como produtor de petróleo, está se beneficiando dos altos preços. Aqui, em Washington, a percepção é a de que o programa nuclear iraniano é um assunto separado. Definir se é possível ou não lidar com o programa nuclear do Irã não está necessariamente ligado a esses outros assuntos. A percepção aqui nos EUA é a de que o Irã está se movendo muito rápido no sentido de obter capacidade nuclear, e que isso seria um evento que deterioraria muito a estabilidade da região. Não é uma questão de pesar os benefícios de se agir nesse momento, que é realmente ruim. A questão é analisar se a ação é grave o suficiente para demandar ação.





Folha Online - Então o principal não é se o ataque pode aumentar ainda mais o preço do petróleo, mas se ele deve ser realizado?

Berman - Creio que a questão é quem irá fazê-lo. Há muita especulação se a administração Bush fará algo antes de deixar o governo. Pessoalmente, creio que essa possibilidade seja pequena. Estamos em ano de eleição, o presidente é muito impopular, e ele ainda está tendo que lidar com o a nova Estimativa da Inteligência Nacional de dezembro do ano passado, que praticamente tornou impossível que ele aja sem ser acusado de ir contra as recomendações de todas suas agências de inteligência.





O cenário para não se fazer nada, aqui em Washington, é claro. A questão realmente é se alguém mais pode fazê-lo. Israel está muito preocupado com essa questão, as forças israelenses realizaram uma manobra militar em espaço aéreo grego há três semanas, e parece que Israel --que por muito tempo esperou que os EUA tomassem a iniciativa de fazer algo sobre o Irã-- começou a pensar com seria se tomasse a iniciativa.





Folha Online - Então o sr. crê que um ataque contra o Irã, de Israel ou dos EUA, é inevitável?

Berman - Creio que é mais provável que ocorra do que não aconteça, por uma série de razões. Antes de mais nada, porque, pela perspectiva de Israel, o Irã representa uma ameaça existencial. Eles (Israel) não estão separados do Irã por um grande oceano, como nós estamos. Então, quando o líder de um país ameaça apagar seu país do mapa, isso tende a focar a sua mente um pouco. Eu entendo porque eles estão preocupados.





A perspectiva dos EUA é diferente. Há preocupação sobre o Irã adquirir capacidade nuclear pois o país é o principal patrocinador do terrorismo no mundo. Mas também há preocupação que, nesse cálculo, não se fale sobre um Irã nuclear, mas sobre vários. Em 2002, logo antes de os EUA entrarem em guerra com o Iraque, havia apenas um país que sabia-se que procurava obter a capacidade nuclear no Oriente Médio, e não era o Iraque, era o Irã. Hoje, no Oriente Médio e na África, há 13 países diferentes que tentam fazer o mesmo --seis países do Conselho de Cooperação do Golfo e Egito, Iêmen, Turquia, Jordânia, Irã, Argélia e Tunísia.





Os programas estão em diferentes níveis, mas o momento [de início] não é coincidência. Não estamos falando sobre lidar com o Irã. Há outros 12 países que estão vendo isso, e a forma com que lidarmos com o Irã irá definir as decisões estratégicas que esses países irão tomar. Se eles acharem que nós não somos capazes ou não queremos lidar com o Irã, irão buscar essa capacidade (nuclear) para eles contrabalancearem a capacidade nuclear do Irã.





Folha Online - Mas o sr. crê que Israel atacaria o Irã sem um apoio declarado dos EUA?

Berman - É possível. Há uma diferença entre apoio declarado e nenhum apoio. Em 1981, quando eles atacaram o reator nuclear iraquiano em Osirak, a comunidade internacional, inclusive os EUA, condenou publicamente a ação. Mas, em privado, o governo dos EUA dava forte apoio. Então, não é uma questão tão simples se os EUA apóiam ou não a iniciativa israelense. A questão é se os EUA vêem ou não uma iniciativa israelense promovendo seus próprios interesses. E nesse caso particular, isso acontece.





Folha Online - Mas se os EUA não apoiarem abertamente, um ataque não poderia desencadear uma guerra na região?

Berman - Certamente poderia e isso é, obviamente, uma preocupação séria. Mas o que está acontecendo em vários países do golfo Pérsico é que o medo de um Irã nuclear é maior que seu desgosto com Israel. É por isso que tem havido uma série de contatos nos bastidores entre autoridades israelenses e do golfo nos últimos anos. Não é uma questão de gostarem ou não de Israel, mas de verem Israel como o único país que tem tanto a capacidade quanto a vontade de fazer algo sobre o que é um problema para eles também [o Irã].





Folha Online - A ONU já impôs três pacotes de sanções contra o Irã, além das impostas unilateralmente por países do Ocidente. Aparentemente, elas não tiveram nenhum efeito sobre o programa nuclear iraniano. Se a diplomacia está falhando, qual poderia ser a solução? Apenas um ataque militar? Ou há outra forma?





Berman - Está claro que o caminho diplomático está estagnado e que não há pressão econômica suficiente sobre o Irã para fazê-lo mudar de idéia. Portanto, a ação militar se mostra cada vez mais provável. Mas, não significa que não temos opções. Há uma série de coisas que a comunidade internacional pode fazer, incluindo pressão econômica sobre o setor energético iraniano, um embargo sobre a gasolina, coisas assim. Realmente, elas expandiriam a pressão que temos sobre o Irã. Podemos chegar ao mesmo lugar, onde apenas a ação militar pode atingir o resultado desejado, que é impedir o Irã de adquirir capacidade nuclear. Mas, não tentamos esses outros caminhos, e o tempo está ficando escasso para fazê-lo.





Folha Online - O sr. crê em alguma grande mudança nessa questão após a eleição nos EUA?

Berman - Absolutamente. Se for (o republicano John) McCain, provavelmente não, mas você pode esperar uma política mais agressiva. Porque, se o presidente Bush, após o relatório da inteligência, não tem uma opção militar crível para usar, McCain terá. Ele não estará marcado pelo legado no Iraque nem pelos erros da administração Bush sobre o Irã. Mas se for (o democrata) Barack Obama, é um mundo completamente diferente. Obama tem falado sobre se engajar em negociações com os iranianos sem pré-condições. Essa é essencialmente uma forma de os iranianos falarem com os EUA enquanto continuam seu programa nuclear.





A perspectiva é de Israel é: a janela de oportunidade para fazer algo está se fechando muito rápido. Eles não acham que --se houver uma administração Obama e, possivelmente, se houver uma administração Mccain-- eles teriam tanta liberdade de movimento quanto têm agora. Eles podem (ter) sob McCain, mas eles certamente não terão sob Obama. Se você é um estrategista israelense, você está vendo os próximos seis meses como o momento para fazer algo.





Folha Online - O sr. crê que o Irã está tentando produzir armas nucleares?

Berman - Creio que sim. Muito do que estão desenvolvendo vai muito além do necessário para a simples geração de energia nuclear. Há também o fato de que a União Européia e os EUA ofereceram três vezes ao Irã a tecnologia de água leve para reatores nucleares, necessária para a produção de energia, e os iranianos recusaram. Isso diz algo sobre para que eles querem usar a tecnologia (nuclear). Eles não estão felizes apenas em ter a tecnologia para a produção de energia nuclear. Estão buscando algo que possa ser transformado em uma arma também.





Folha Online - E todas essas negociações seriam uma forma de ganhar tempo...

Berman - Exato. Ali Larijani, atual líder do Parlamento iraniano, era o negociador-chefe da questão nuclear. Quando as conversas entre a União Européia mais três (EUA China e Rússia) falharam, e o Irã foi levado ao Conselho de Segurança, em 2006, Larijani deu uma entrevista na qual afirmou: "preciso agradecer à União Européia, pois ela deu um presente à República Islâmica do Irã. Eles nos deram dois anos de negociações nos quais pudemos trabalhar em nosso programa nuclear". Claramente, a estratégia iraniana é "continue conversando, mas continue trabalhando (no programa)".





Folha Online - Como o sr. avalia as declarações recentes feitas pelo chefe da Aeia (Agência Internacional de Energia Atômica), Mohamed ElBaradei, de que se houvesse um ataque contra o Irã, ele iria renunciar e a região se tornaria "uma bola de fogo"?





Berman - São duas coisas diferentes. É possível que se crie um conflito regional? Sim, é possível, apesar de muitos Estados árabes sunitas do golfo estarem tão preocupados com o Irã, que não é sunita e não é árabe, que podem querer ficar de fora se houver uma operação militar. Sobre se ele renuncia ou não, francamente, não importa. Sob seu comando, a Aiea tem sido menos que séria sobre realmente monitorar a capacidade nuclear do Irã. A razão eu não sei. Mas, se ele renunciar ou não, em protesto, isso mudará muito pouco o curso da história.



Fonte

www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u420034.shtml

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