Juan Lara
Luanda, 23 mar (EFE).- O papa Bento XVI retorna ao Vaticano após sua primeira viagem oficial à África, marcada pela polêmica gerada por suas declarações contra o uso de preservativos no combate à aids.
Entretanto, em declarações concedidas a jornalistas que o acompanham no voo de volta para o Vaticano, o papa disse que leva da África "a cordialidade e a alegria" demonstrada pelo povo africano para com ele durante sua passagem pelo continente.
O pontífice visitou Camarões, onde entregou às Conferências Episcopais africanas o "Instrumentum laboris" ou documento de trabalho para a preparação do II Sínodo para a África, e Angola, onde lembrou o 500º aniversário da evangelização deste país.
A polêmica envolvendo a viagem do papa começou antes mesmo de este pisar em solo africano. Em declarações a jornalistas que estavam em seu avião rumo à África, Bento XVI afirmou que a doença não pode ser combatida somente com dinheiro, nem "com a distribuição de preservativos, que, ao contrário, aumentam o problema".
A aids, segundo o papa, pode ser vencida com "uma humanização da sexualidade, uma renovação espiritual, que comporta uma nova forma de comportamento de uns com os outros".
Em um continente no qual 27 milhões de pessoas são portadoras do vírus da aids, as palavras de Bento XVI foram duramente criticadas em vários países ocidentais, os quais defenderam o uso do preservativo como elemento fundamental para prevenir a transmissão da doença.
O porta-voz vaticano, Federico Lombardi, assegurou que a Igreja Católica não mudará de postura e acrescentou que, na África, a aids não é transmitida apenas via relações sexuais, mas também devido às precárias condições de higiene.
Já depois de chegar a Camarões, o papa Bento XVI declarou que a África "está em perigo" devido aos "imorais sem escrúpulos que tentam impor o reino do dinheiro desprezando os mais miseráveis".
O texto do "Instrumentum laboris" acusa as multinacionais de "invadir" gradualmente o continente africano para se apropriar dos recursos naturais, com a cumplicidade dos dirigentes locais, sobre os quais diz que obstaculizam a democratização de seus países.
Se em Yaoundé seu discurso teve um acento mais religioso, em Luanda o tom de Bento XVI foi mais social e político. Diante do presidente angolano, José Eduardo Dos Santos, o papa disse que é necessário acabar com a corrupção e que "chegou o tempo da esperança na África".
"Vocês podem transformar o continente, libertando seu povo do flagelo da avidez, da violência e da desordem, levando-o ao caminho de uma moderna e civil democracia", afirmou o papa.
Bento XVI acrescentou que uma democracia exige "o respeito e a promoção dos direitos humanos, um Governo transparente, uma Justiça independente, uma comunicação livre, uma administração pública honrada, uma rede de escolas e de hospitais, e a firme determinação de acabar de uma vez por todas com a corrupção".
Em Luanda, o papa pediu aos católicos que combatam as superstições existentes em regiões da África e que ofereçam o Evangelho às pessoas "desorientadas, que vivem no terror" e que chegam a sacrificar meninos de rua por considerá-los bruxos.
Bento XVI voltou a defender a família e a condenar o aborto, afirmando que é uma "ironia" que seja incluído como uma ação de "saúde materna", e que é "desconcertante a tese dos que consideram que a supressão da vida seria uma questão de saúde reprodutiva".
O papa chegou a citar o Protocolo de Maputo, documento sobre os direitos da mulher na África, o que foi interpretado por alguns veículos de imprensa como uma rejeição do aborto terapêutico (realizado quando a gestante corre risco de vida).
Federico Lombardi ressaltou que o Vaticano não condena o aborto terapêutico quando a cura da grávida doente for, inevitavelmente, a morte do filho, e que o papa apenas se expressou "contra os programas de saúde reprodutiva que defendem o aborto como meio de controle da natalidade".
A viagem do papa se viu atribulada mais uma vez após a morte de duas moças em um tumulto ocorrido ao tentarem entrar no estádio Dois Coqueiros, em Luanda, para um encontro dos jovens angolanos com o pontífice.
O papa se despediu de Angola com uma missa para mais de um milhão de pessoas, durante a qual pediu à África para que se "erga" e se liberte de todos os males, criando um futuro de reconciliação, justiça e paz.
O último compromisso de Bento XVI foi com as mulheres, diante das quais defendeu o direito das africanas de fazerem parte da vida pública, "sem que isso represente a diminuição de sua insubstituível função dentro da família". EFE
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